Confesso que refleti algum tempo, antes de me decidir a escrever esse texto. Me passou pela cabeça o receio de desagradar muitos leitores. Em um rápido passeio pela web, constatei facilmente que a velha e mofada falsa-polêmica continua, mesmo depois de quase quatro décadas de apaixonadas discussões.
Porém, já que me decidi por escrever, prometo que não ficarei em cima do muro! Em troca, não te peço que concorde comigo, caro leitor, isso não. Peço apenas que, se possível, desarme seu espírito por um momento. Fique leve, porque vamos subir um pouco, sair do chão dessa discussão. Vamos, lá de cima, como se estivéssemos voando em um balão, olhar então para baixo. Espero que, no mínimo, a gente faça uma viagem interessante.
Vamos enxergar tudo bem pequenino, lá embaixo. As fábricas, as casas, as pessoas e seus interesses pessoais, corporativos, seus paradigmas. Enquanto o balão voa bem devagar, lá de cima tudo parece tão pequeno, tão insignificante…. No entanto, ao contemplarmos o céu, acima de nós, percebemos a imensidão do universo do qual nós, seres humanos, a bordo de nosso pequeno planeta, somos hóspedes.
Essa visão, costuma nos levar, sem querer, a íntimas indagações, na verdade muito antigas em nossa sociedade. Fazem parte de nós, desde que, como humanos, começamos a pensar, a usar o raciocínio e a intuição, ao invés de apenas nosso instinto. São do tipo:
Qual o sentido da vida? O que estamos fazendo aqui? Qual nosso papel nesse mundo louco?
Calma! Isso não vai virar uma aula de filosofia! Estas questões aparecem naturalmente, sempre que conseguimos sair do “chão de nossas preocupações” e voar um pouco mais alto, em nosso pensar. Quando conseguimos libertar nossa mente, mesmo que por instantes, das tarefas diárias, ela costuma ir bem longe, atrás dessas respostas.
Pois bem; aqui do alto, em nosso balão, o que significa essa discussão, que já dura décadas, sobre chamarmos aqueles produtos de agrotóxicos ou de defensivos agrícolas? Nada!!! Daqui de cima, quero saber, isso sim, de outras coisas. Por exemplo:
Afinal, esses produtos, que usamos nas lavouras, contaminam o ambiente? Fazem mal à nossa saúde, ou não?
Sim, a grande maioria deles nos fazem mal e contaminam o ambiente. A intensidade disso depende, além da natureza química de cada um, das doses e da frequência com que são utilizados, além do período de carência, que é o intervalo de tempo entre a última aplicação e a colheita.
Então por que os produtores de alimentos os utilizam?
Em alguns casos, porque não tem outro jeito, por enquanto. Outros porque são mal orientados pelos técnicos, pelos fabricantes, pelo governo, pelas universidades. Em outros, o produtor é literalmente pressionado a usar; fazem “terrorismo” na cabeça deles.
E… Por que os produtores são mal orientados?
Por que todo o agronegócio está contaminado pela necessidade dos fabricantes de vender seus produtos. Assim como a medicina está contaminada pela necessidade dos laboratórios de vender seus remédios. Tal como a televisão está contaminada pela necessidade de vender espaço aos seus anunciantes. Não são apenas os produtores, toda a sociedade, pesquisadores, professores, alunos, consultores, estão contaminados! É quase inevitável!
Existe saída para essa questão? Podemos produzir em grande escala, alimentos sem agrotóxicos?
Em alguns casos sim, em outros ainda não. A pesquisa precisa de patrocínio, de dinheiro, para avançar. Quem vai investir na Agroecologia, por exemplo? O direcionamento da pesquisa, em última análise, é ditado pelos seus patrocinadores. No Brasil, quem tem mais interesse nessa questão: governo ou os poderosos fabricantes multinacionais? Aí a gente cai em outro problema… O da seriedade dos governos! Não quero nem começar essa discussão aqui, pois isso faria desse texto um livro bem grosso!
Nessa altura, gostaria de finalizar esse breve papo, dizendo o seguinte:
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Os produtores não são os culpados; eles fazem o melhor que podem, e trabalham duro, sou testemunha disso;
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O extremo da hipocrisia é não reconhecer a própria hipocrisia. Esse é o caso de nossa sociedade, como um todo, incluindo os governos;
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Existem muitas pessoas bem-intencionadas, trabalhando para os fabricantes de insumos. Porém, a lógica do sistema capitalista é essa mesma. Vender, vender e vender! Por pior que seja, ainda é bem melhor que os outros modelos já testados e reprovados, como o comunismo, por exemplo;
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Apenas a evolução individual das consciências, pode nos levar à uma rápida evolução, como sociedade. Então, com menos hipocrisia, menos interesses mesquinhos e menos ignorância, aí sim, poderemos mudar o quadro atual.
Portanto, diante dessa perspectiva, sou favorável a utilização do termo AGROTÓXICO. Assim, apesar de ainda precisarmos, em vários casos, de sua utilização, sempre nos lembraremos de que estamos lidando com substâncias potencialmente perigosas, muitas delas de difícil eliminação por parte do solo, das águas e do nosso próprio organismo.
Afinal, no mundo inteiro, essas substâncias são conhecidas como “pesticidas”. Em nossa legislação, sempre foram, e continuam sendo chamadas de “agrotóxicos”. Então, se você quiser chamá-las de “defensivo”, chame! O importante é saber que o produtor usa porque precisa, e a gente come porque não tem outro jeito (salvo alguns casos). Mas…. Nem os produtores gostam de usar, nem nós gostamos de comer. Me diga: qual o problema em admitirmos isso?
Do ponto de vista agronômico, é importante saber que, mesmo com toda a ignorância e hipocrisia, estamos caminhando, a passos largos, para a não-dependência dos agrotóxicos. Isso significa descontaminar solos, rios, alimentos, pessoas. É uma ótima notícia! Ou não?
Não se preocupe com os fabricantes! Eles rapidamente mudarão suas linhas de produção. Fabricarão produtos biológicos, ou qualquer outra coisa que estivermos dispostos a comprar.
Antonio N. S. Teixeira
Diretor Executivo – IBA