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Adubo orgânico sim… mas com ciência!

As origens do modelo atual de adubação

Existia há menos de cem anos, uma consciência geral, entre os produtores de alimentos, de que a adubação orgânica, de certa forma, era insuperável. Naquela época, nem se imaginava que, um dia, a ciência agronômica seria completamente arrastada pelas turbulentas águas de um novo e bilionário negócio: o agronegócio.

A revolução industrial, as guerras mundiais e posteriormente o crescimento populacional ocorrido no século XX, foram os precursores do agronegócio, como o entendemos hoje. Houve a necessidade (e a oportunidade) de produzir alimentos em larga escala, que fez surgir uma agricultura digamos, industrial. Aos poucos, a visão química da agronomia foi se estabelecendo no campo e nas universidades, fruto dos esforços da indústria para vender seus produtos.

Logo, esse novo modelo foi impulsionado pela chamada “Revolução Verde”, sob o argumento (o mesmo usado até hoje) da sua essencialidade para acabar com a fome no mundo. Como resultado, houve sim, um grande aumento na quantidade de alimentos que passamos a produzir. No entanto a fome só aumentou, pois o modelo adotado ajudou a concentrar a renda nas mãos de poucos, além de excluir os pequenos do campo.

Assim, tornou-se óbvio para qualquer observador mais atento, que o modelo atual de produção de alimentos jamais resolverá o problema da fome no mundo, já que as causas estão muito mais relacionadas a questões como políticas públicas, conflitos internacionais, incompetência generalizada e corrupção na administração pública, desigualdades sociais, etc.

A maioria de nós hoje, tem uma certa dificuldade em enxergar as questões de forma sistêmica ou holística. Preferimos, em geral, trabalhar com sistemas que podem ser calculados, compartimentalizados e compreendidos através da visão cartesiana e reducionista que nos é ensinada nas escolas e universidades.

Dessa forma, o conjunto das vivências, experiências e tradições dos agricultores, na lida com as plantas e o solo ao longo dos séculos, ficou em grande parte esquecido, atropelado mesmo, pelo novo modelo de produzir alimentos, chamado agronegócio. Talvez tenha sido assim que nos esquecemos da adubação orgânica e adotamos os fertilizantes minerais altamente solúveis.

Fonte: Pixabay

No entanto, é curioso notar, após algumas décadas de uso, começamos a entender que a adubação estritamente mineral e solúvel não atende mais nossos anseios, tanto na busca por resultados, quanto por sustentabilidade. Por quê?

Pois bem, uma parte da resposta está no crescimento das doses utilizadas, em função das crescentes produtividades. Os efeitos salinos, acidificantes e supressores da vida do solo, se tornaram críticos e evidentes, nessas novas dosagens.

Foi então que as empresas fabricantes começaram a oferecer novas alternativas, como os fertilizantes de liberação gradual e os organominerais. Esses últimos, em tese, além de abrandar a agressividade química ao solo, fornecem um pouco de matéria orgânica junto, o que é essencial para o funcionamento dos solos tropicais.

Ademais, sabemos que essa busca por uma adubação mais eficiente, passa, necessariamente, pela questão dos custos, para se tornar viável. Nesse sentido é que começamos a trabalhar, a cerca de nove anos, na possibilidade de o próprio produtor fazer seu adubo na fazenda, a partir de seus passivos ambientais e os dos vizinhos, acrescidos de bons pós de rocha encontrados na região.

Os tipos de adubação orgânica

Definitivamente, o solo não é uma mera “sopa de letrinhas”, do tipo NPK etc….e essa simplificação quase sempre nos leva a cometer erros que o tempo acaba por desnudar.

A “adubação orgânica” é um termo genérico, que abriga vários materiais. Vamos aqui classificar de forma simples alguns principais:

  1. Materiais orgânicos (dejetos animais, estercos, camas e resíduos vegetais).
  2. Adubos organominerais (materiais orgânicos compostados ou não, misturados com fertilizantes minerais).
  3. Compostos orgânicos (materiais orgânicos submetidos ao processo de compostagem).
  4. Compostos orgânicos enriquecidos com pós de rocha (materiais orgânicos, acrescidos de pós de rocha e posteriormente compostados).
  5. Complexação orgânica de minerais (fertilizantes minerais ligados quimicamente à substâncias orgânicas complexantes).
  6. Biofertilizantes (fertilizante orgânico, conseguido através da digestão anaeróbica de material orgânico).

Cada lavoura, cada solo e cada objetivo final, têm os seus detalhes e, portanto, suas necessidades específicas de adubação. Por isso, a melhor estratégia deve ser decidida em conjunto: pelo técnico e por quem conhece essas necessidades de perto. O caminho fácil das “receitas de bolo”, deve e precisa ser evitado, sob pena de se cometerem erros grosseiros.

Como fazer um adubo orgânico bem feito

E o que significa um composto orgânico bem feito? Significa que todo o processo seguiu padrões mais ou menos rigorosos de produção. Esses padrões passam por:

  1. Escolha e análise de boas matérias primas;
  2. Máquinas, equipamentos, pátio e mão de obra adequados;
  3. Receita equilibrada (relação C/N, elementos minerais, bioativador, etc.);
  4. Controle diário de parâmetros (ex.: temperatura, umidade, odor, aeração);
  5. Análise completa do composto pronto (química, biológica, orgânica, sanitária).

O composto orgânico maturado, produzido pela atividade microbiana aeróbica, leva uma série de vantagens, em relação ao uso do material orgânico não compostado. Esse último apresenta inconvenientes, como umidade excessiva, odor desagradável, necessidade de altas doses, atrai moscas, entre outros. Além disso, pode conter transmissores de doenças e sementes de plantas invasoras.

No material cru, ou compostado de forma aleatória, os nutrientes minerais podem estar presentes de forma desequilibrada. Alguns deles, como o potássio e o nitrogênio, podem se perder rapidamente.

Mas, talvez os dois maiores valores de um composto orgânico bem compostado, sejam:

  1. Os teores de ácidos orgânicos, aminoácidos, compostos fenólicos e substâncias orgânicas complexas e variadas, resultantes da atividade microbiana sobre os materiais.
  2. A própria gama de microrganismos benéficos que ele possui, o que o torna também um poderoso multi-inoculante. Benefício adicional que é perdido, quando, ao ser granulado, o adubo é submetido à altas temperaturas ou acidulações.

Portanto, esse conjunto de inoculantes, acoplado a substâncias orgânicas complexas, altera para melhor a eficiência de absorção dos elementos minerais no solo, na medida em que favorece a ativação biológica do mesmo, ou bioativação. Consequentemente, a quantidade total necessária de aplicação desses elementos minerais diminui.

É viável fazer o próprio adubo na fazenda?

É perfeitamente possível fazermos o próprio adubo na fazenda, a partir dos resíduos que lá geramos. Existem empresas e consultores especializados nisso. E como em qualquer atividade, os resultados variam do péssimo ao excelente. Por isso é importante não se iludir com conversas ou com aparências construídas pelo marketing. O melhor é procurar conhecer melhor os resultados já obtidos pela empresa ou consultor, em outras fazendas.

Uma boa dica para quem pretende elaborar na própria fazenda, um adubo de qualidade para sua lavoura, é não se contentar com o “mais ou menos”. Se você fizer um adubo em que não confia totalmente, acabará usando junto o adubo comprado, por segurança. Então os seus custos subirão, ao invés de caírem. Também é bom discutir com seu consultor sobre os eventuais acréscimos minerais a serem efetuados, caso sejam necessários.

Quando fazemos o adubo na própria fazenda, com ciência, com critério, temos uma ferramenta fantástica para impulsionar nosso negócio. Isso porque, ao mesmo tempo em que reduzimos custos, adquirimos certa imunidade com relação as variações de preço e disponibilidade a que o mercado de fertilizantes está sujeito, todos os anos.

Também adquirimos maior flexibilidade para produzir um adubo que seja mais adequado para cada situação, em nossa propriedade, além de dar um destino nobre aos resíduos produzidos. E a possibilidade de produzir o adubo de forma barata, torna viável a aplicação de matéria orgânica em quantidades bem maiores do que se fôssemos comprar um organomineral, por exemplo. Com isso conseguimos alterar, para melhor, propriedades fundamentais como a CTC, o teor de carbono, a capacidade de absorver e de reter água, a compactação, entre outras.

Vantagens da adubação orgânica

De uma forma bem resumida e simplificada, podemos dizer que a adubação orgânica tende a apresentar melhores resultados no campo, quando comparada com as adubações estritamente minerais. Essa é uma afirmação genérica, reconhecemos. Porém os detalhes e especificidades dessa discussão são longos para esse momento.

Sendo assim, podemos citar e comentar algumas vantagens da adubação orgânica:

  1. Aumenta a produtividade. São inúmeros os trabalhos científicos que provam essa tese.
  2. Redução dos custos de produção. Isso é muito mais verdadeiro quando fazemos o adubo na fazenda.
  3. Melhora a fertilidade do solo, ao longo do tempo. Esse fator depende também da quantidade oferecida, o que é função do custo.
  4. Reduz a infestação de nematoides e de algumas doenças do solo, pela competição gerada entre os organismos, num ambiente favorável.
  5. Aumenta a capacidade de absorção e de retenção de água do solo A matéria orgânica e a atividade dos organismos, se encarregam disso com competência.
  6. Aumenta a população e a diversidade dos organismos do solo. É a coisa mais importante que se pode fazer, em solos tropicais.
  7. Melhora a qualidade dos alimentos e, por vezes, seu preço de venda, dependendo da cultura, como café, HF.
  8. Diminui o uso de substâncias agressivas ao homem e ao ambiente. Menor contaminação das águas e uma nítida diminuição da necessidade de defensivos, muitas vezes tóxicos.

Se você quiser começar uma produção própria de adubo na fazenda, sugiro que mantenha em alta o seu raciocínio livre e independente. Manter a mente aberta e lúcida, sem as contaminações dos interesses externos, é importante para se chegar a um lugar melhor do que onde já estamos.

Termino com palavras de Antoine de Saint-Exupéry:

“O futuro não é um lugar para onde estamos indo; mas um lugar que estamos criando. O caminho para ele não é encontrado, mas construído. E o ato de fazê-lo, muda tanto o realizador, quanto o destino”.

Antonio N. S. Teixeira

Diretor Executivo – IBA

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