Se você quiser escalar o monte Everest, vai precisar de, no mínimo, coragem, dinheiro e um bom planejamento, certo? Mas também precisará, obviamente, se deslocar até lá. Para isso você pode usar, por exemplo, um carro, depois um trem, depois um avião e novamente um carro.
Chegando ao pé da montanha, pode ser que precise ainda de um veículo off-road, para subir mais um pouco. Depois disso, quem sabe algum animal, como um cavalo ou uma mula, possa te levar mais um pouco para cima, na direção de seu objetivo.
Chegará o momento, no entanto, que terá que seguir a pé. Sozinho ou em grupo, com muita oupouca carga, você fatalmente seguirá a pé. Poderá levar consigo, tubos de oxigênio suplementar.Ou não. Sua caminhada poderá ser de extrema dificuldade. Ou não. Chegará ao seu objetivofinal. Ou não!
Pois bem, nesse ponto de nossa escalada, gostaria de sugerir uma pausa, para olharmos bem de cima, o panorama atual de nossas lavouras. O que você está vendo hoje daí? Como enxerga o futuro próximo? Como aumentaremos a tão desejada “produtividade”? E o lucro, esse pobre esquecido, aumentará também, ou só as despesas?
Desculpe, tenho mais perguntas. Até quando mediremos a “produtividade” como sendo a quantidade de sacas por hectare de uma determinada safra? Cem sacas de soja/ha? Trezentassacas de milho? Cento e vinte de café? Mas… a que custo imediato? A que custo, a longo prazo?Com que qualidade? Com que nível de desgaste? Respeitamos nossos limites? E os dos outros?
Devemos, afinal, medir a produtividade de uma lavoura, ou a produtividade total de uma área (ou fazenda), ao longo dos anos? E o que tudo isso tem a ver com o monte Everest?
Tenho visto agrônomos defenderem a ideia de que o aumento da produtividade agrícola se deve, em grande parte, ao aumento do uso dos fertilizantes minerais. Citam, inclusive, estatísticas do século passado, mostrando graficamente curvas de crescimento quase paralelas. Estariam eles certos ou equivocados?
Arrisco-me a dizer que ambos! Estão certos quando se referem ao período citado, as últimas décadas do século XX. Mas, equivocam-se quanto ao presente. Senão vejamos. Os números comparam, de um lado, à quantidade média de fertilizantes utilizada por cultura; de outro à média geral de produtividade dessas culturas. Podemos imaginar que, na grande maioria das propriedades, as quantidades de adubo usadas eram de fato menores que a ideal. Daí os aumentos, paralelos, de uso e de produção por área.
A situação hoje, no entanto, é completamente diferente. Não tenho dados estatísticos, mas
quase todos nós, que visitamos fazendas diariamente, conhecemos inúmeros casos de produtores aumentando sua adubação, enquanto a produtividade se mantem ou até mesmo cai. Mais fácil ainda é encontrar casos em que o produtor reduz o gasto com adubação e verifica, surpreso, que sua produção aumentou. O que está de fato acontecendo?
Voltando ao Everest, podemos comparar a era da carência mineral com o início de nossa viagem montanha acima. O fertilizante mineral foi o veículo ideal para o início da subida, rumo às altas produtividades. A certa altura, porém, aquele veículo não poderá seguir adiante. Será necessário outro tipo, para nos conduzir mais acima.
Doses crescentes de fertilizantes aplicadas ao solo, não só acabam por diminuir a importante vida nele contida, incluindo as raízes, como deixam no solo parte desses minerais, que vai se acumulando (ou não), dependendo do nutriente e do tipo de solo e exploração.
Hoje já se sabe que, nas condições tropicais, a fertilidade é atributo do sistema, não do solo.Também já sabemos que, quanto mais biomassa conseguirmos acrescentar nesse sistema, equanto mais conseguirmos a ciclagem dessa biomassa, maior fertilidade teremos ali.
Acrescentar mais biomassa ao sistema, tem a ver com rotações e sucessões mais inteligentes do que a simples lógica do mercado imediato sugere. Tem a ver com o plantio de diferentes coquetéis” de plantas de cobertura, de acordo com a época do ano e as condições locais. Tem a ver com biodiversidade.
A ciclagem da biomassa, por sua vez, é realizada, primordialmente, pelos organismos vivos presentes no solo. Todos trabalham; dos maiores, como minhocas e besouros, aos microrganismos. O que devemos fazer então, é promover as melhores condições para que esses amigos cresçam e se desenvolvam. Isso inclui reduzir o uso de substâncias muito solúveis, em doses agressivas no solo e nas plantas.
Por tudo isso, e de novo falando da nossa subida pela montanha, talvez seja o momento de deixarmos o veículo que nos trouxe até aqui (fertilizante mineral solúvel), nos atuais patamaresquantitativos (ou um pouco abaixo). Assim poderemos embarcar em outro, mais adequado paraessa fase da subida (da produtividade). É claro que existem casos e casos, não vamos generalizar.
Mas é interessante observar que, assim como na montanha, após determinada altura, apenas veículos vivos podem continuar a subida (cavalos, mulas ou apenas nós mesmos). A montanha pode estar nos dizendo: QUE TAL USAR A VIDA DO SOLO (e não a sua morte!) PARA CONTINUAR A SUBIR?
Antonio N.S. Teixeira
Diretor Executivo – IBA
Antonio N.S. Teixeira, Diretor Executivo do Instituto Brasileiro de Agroecologia – IBA – nos convida a subir o Everest para entender que, em algum momento, temos de fazer uma pausa para buscar maiores feitos. Pois bem, esse momento já aconteceu nos anos 1990 na agricultura brasileira. Naquele momento, olhamos para trás alguns anos e nos perguntamos sobre o que esses “gringos doidos” estão fazendo. Era os gringos de Rolândia, de Brasília, de Ponta Grossa, de Cruz Alta, Ibirubá e Ijuí, de Pirassununga, de Uberlândia e muito mais (ver histórico em https://agronomos.ning.com/profiles/blogs/hist-rico-do-sistema-plantio-direto-spd). Ao mesmo tempo nos perguntamos aos pedólogos que já conheciam a intimidade dos solos tropicais por mais de 4 décadas, qual era o comportamento desses solos depois de perderem sua cobertura vegetal natural. Finalmente, abrimos nossos ouvidos para a sapiência de pessoas inesquecíveis como a Dra. Ana Primavesi. Entendemos, naquele momento que, para concluir a escalada rumo ao topo do Everest, precisávamos de alicerces, que eram três: não revolver o solo nunca mais (#foraarado #foragrade); promover a agrobiodiversidade com a rotação plurianual de culturas (#foramonocultura #foramonosucessão) e, por fim, manter o solo permanentemente coberto com culturas de cobertura vivas ou de seus resíduos. Ou seja, para subir o Everest precisávamos de uma visão AGROECOLÓGICA da agricultura. Produtividade, como pergunta Antônio Teixeira, deixava de ser importante. Saúde e qualidade do solo era o nosso foco. Muitos Engenheiros Agrônomos se propuseram a assistir os agricultores e empresários rurais, responsáveis por pequenas áreas – assentamentos, agricultura familiar – até vastas áreas dedicadas à produção de commodities ou de carne bovina, na mudança de paradigma e na adoção do sistema agroecológico que tomou conta do mundo tropical – o SISTEMA PLANTIO DIRETO, adotado pela FAO como CONSERVATION AGRICULTURE . Portanto, as bases de uma agricultura agroecológica foram lançados há muito tempo e agora colhemos os frutos – biopesticidas e controle biológico de pragas e doenças, fertilizantes orgânicos e organominerais de alta eficiência, microrganismos que retiram nitrogênio do ar ou buscam o fosforo nas entranhas do solo, raízes de plantas e minhocas que “amanham” o solo fazendo o trabalho de vários arados todos os dias, e muito mais. E, o mais importante, os alicerces de uma agricultura orgânica verdadeiramente agroecológica a exemplo do Sistema Plantio Direto de Hortaliças. Estamos prontos para subir o Everest sem correr riscos ou amadorismos e, para isso, temos profissionais formados em universidades, altamente especializados, prontos para guiar essa subida – Engenheiras e Engenheiros Agrônomos, sem os quais, nenhum grama ou mililitro de pesticida – químico ou biológico – ou de fertilizante – orgânico, organomineral ou mineral – deve ser recomendado. Com a sua assistência, chegaremos ao topo do Everest sem o risco de sermos arrastados pela erosão.