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A pesquisa científica e a produção agrícola

A ciência é, sem dúvida, uma das maiores invenções da humanidade. Mas tem gente que confunde ciência com a verdade absoluta. Tem gente que confunde ciência com a obra divina. Não é. A ciência é obra humana, portanto falha. Mas isso não tira o seu mérito, que é buscar o conhecimento e a compreensão dos fenômenos, e assim gerar possibilidades tecnológicas em benefício da humanidade.

A observação atenta, o raciocínio lógico, filosófico, a intuição e a percepção, se somam à pesquisa experimental, para formar o conjunto de ferramentas que compõe o método científico. Dessas ferramentas, hoje é comum se exaltar a pesquisa, e infelizmente, desprezar as demais.

Falando então da pesquisa científica, apesar da boa intenção da maioria dos pesquisadores, ela está longe, bem longe de ser isenta. O volume de artigos publicados em determinado assunto, é altamente influenciado pelo volume de verbas destinadas ao mesmo.

É compreensível que assim seja, porque, para se realizar uma pesquisa científica, quase sempre é necessário um montante em dinheiro, que possa custear as despesas relacionadas a ela (mão de obra, laboratórios, insumos, etc.). E somente irá bancar tudo isso, quem tem algum interesse nos resultados. Então, é natural que alguns assuntos sejam exaustivamente pesquisados, enquanto outros, de menor interesse do dono do capital, sejam menos.

Talvez seja por isso que na maioria dos países desenvolvidos (talvez até o sejam por isso), o governo destine verbas substanciais à pesquisa científica. Um país sem pesquisa, e um país sem futuro. Mesmo assim, a escolha dos temas a serem pesquisados ainda está sujeita ao viés das governanças.

Em países onde a maioria da população é muito simples, com baixo nível de compreensão e discernimento, como no Brasil, os governos normalmente escolhem destinos mais populistas para gastar seu orçamento. Porque vivemos um tempo escasso em estadistas e altruístas; então, o objetivo de quem governa é o voto, para se perpetuar no poder ou, pior ainda, o dinheiro fácil e ilegítimo. Mas existem exceções, graças a Deus!

Face a essa realidade, é justo e legítimo que os setores produtivos da sociedade se organizem, no sentido de viabilizar pesquisas científicas que atendam às suas demandas. Essas pesquisas, quase sempre são aplicadas, e quase nunca básicas, pois quem investe tem pressa no retorno do capital investido.

Dentre os setores produtivos, um dos mais dependentes da pesquisa é o agronegócio. Pelo fato de trabalhar diretamente com a natureza e seus fatores bióticos e abióticos, é preciso compreender suas leis, seus fluxos, as múltiplas interações de seus fatores e suas especificidades.

Não é uma tarefa simples. É necessária uma visão holística, para entender que o todo não é apenas a somatória das partes. O todo tem vida própria, e cada parte dentro dele age de modo diferente do que agiria, se estivesse separada. Então, nesse caso, o reducionismo cartesiano nem sempre funciona bem.

Atualmente existe um movimento crescente dos produtores rurais, no sentido de organizar e bancar suas próprias instituições de pesquisa aplicada. Na falta do governo, eles estão tirando esse dinheiro do próprio bolso, e em alguns casos, chamando players do mercado, como indústria e comércio de insumos, de máquinas, bancos, fundos de investimentos, entre outros, para ajudar, porque fazer pesquisa não custa pouco.

Neste caso o eventual aporte de recursos dessas empresas, porém, não pode contaminar os objetivos e muito menos os resultados das pesquisas. O que o produtor quer saber é: como melhorar seus resultados, como produzir melhor, com o menor custo possível e sem comprometer os recursos naturais ao longo do tempo. O produtor fica feliz quando a pesquisa diz que ele NÃO precisa comprar isso ou aquilo, e não o contrário. Por sua vez, indústria fica feliz quando a pesquisa diz que ele precisa comprar.

Portanto, existe um conflito de interesses, que é tanto maior, quanto menos essencial for o insumo ou produto. Então, quando a pesquisa comprova a não essencialidade de um insumo, para determinada condição, a indústria fica triste. Mas o contrário também é verdadeiro.

No final da história, não importa quem bancará a pesquisa, de toda forma precisaremos de pesquisadores incorruptíveis e buscadores da verdade científica, dentro dos limites humanos. O cientista precisa estar acima dos interesses menores, para ser digno desse nome. Precisa ser puro de intenções. Mas também precisa ser competente. Por último, é interessante notar, que a lógica da pesquisa científica é diferente da lógica do mercado, no sentido de ter concorrentes. Ela não os tem. Quanto mais empresas de pesquisa, mais pesquisadores, maior a produção de conhecimentos aplicados, que se complementam.

Como as pesquisas são divulgadas, compartilhadas para uso comum, todos saem ganhando. Por isso mesmo, as grandes instituições de pesquisa do mundo, sempre trabalham com convênios entre elas, cada qual com a sua notória inteligência, como forma de potencializar a geração de conhecimentos e evitar que, de forma isolada, “inventem a roda” novamente. Do ponto de vista da captação de recursos para a pesquisa, poder-se-ia imaginar haver concorrência entre instituições. Na prática, porém, isso não acontece, porque os interesses dos diversos financiadores são múltiplos. Sendo assim, somente haveria concorrência, se duas entidades apresentassem ao possível financiador, projetos muito parecidos. Daí a importância do intercâmbio entre elas, para evitar pesquisas repetidas. Além disso, cada instituição de pesquisa pode se beneficiar dos resultados das demais, sem ter gastado um só centavo com isso. Então, não é concorrência, é troca! É como trocar ideias com alguém. Você vai embora para casa com a sua ideia e com a ideia do outro também. E vice-versa.

 

AUTOR: Antonio Teixeira, Presidente do Instituto Brasileiro de Agricultura Sustentável

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